Dirce Carneiro - Diana Gonçalves

Textos


Um olho de sol espia a janela.
Chega o som desobediente de carros em quarentena.
O jato da oficina de fronte e o canto do bem-te-vi fazem ponte com o mundo lá fora.
Impossível ficar isolado. Panelaços.
- Fora o presidente maldito! – ecoa o adolescente.
- Comunista! (bem alto), vem de janela mais distante.
- Vai tomar no cu! – grita uma voz máscula, adulta.
- Volta Lula! – provoca outra voz jovem feminina.
...Dominam as vozes masculinas...acho que as mulheres estão nos tambores...
“Ainda bem"...a reação acontece. Um embrião, uma esperança.
Ainda bem que não nos acostumamos...
Ainda bem...que hora para tropeçar no latim. E surgem os tradutores de textos. Os analistas dessa força que o torneiro ainda tem. Sim, porque se estivesse acabado, que mal teria esse bem mal colocado, numa linguagem informal, agora citada fora do contexto?
O mote dos noticiários é a contagem de mortos, a falência da Saúde, mais um general empossado (ou empoçado?). A última é o criminalista defensor de bandido, alçado a serviçal da corte.
Isolamento? Alienação alguns conseguem. Até são felizes. Fazem o jogo do contente. Alheios à dor, incapazes da indignação, de enxugar o luto, expressar a crítica, o ódio ao ódio.
Triste...Para muitos, esse tempo ainda é o de uma bela foto de pudim postada nas redes.
DIANA GONÇALVES
Enviado por DIANA GONÇALVES em 26/09/2021


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