UM DIA DE CELEBRIDADE
Depois dos últimos acontecimentos envolvendo minha vida, amanheci com uma vontade enorme de sair andando pela cidade, sentir o vento fustigar o meu rosto, o sol aquecer o meu corpo, olhar para as pessoas na rua, ver vitrines. Resolvi procurar aquela assistência técnica do meu celular, que comprei baratinho, mas funcionava muito bem, até que o display cismou em deixar todos os dados invisíveis. Eu até já comprara outro, de novo o mais barato, um modelo mais avançado do que o anterior, com aquela anteninha que o deixa maior para eu não perdê-lo dentro da sacola e com fliper (é assim que chama aquela tampinha que abre e fecha?) o que impede de as teclas serem acionadas no aperto da bolsa.
Bem, vocês perguntarão: por que consertar se já tem outro? Pois é, desde que meu filho era pequeno, aprendi, pedagogicamente, que é bom a gente consertar os brinquedos quando eles quebram, para a criança assimilar que na vida tudo pode ser consertado, é uma atitude positiva com a qual a criança convive. Eu sei que não sou nenhuma criança, que um aparelho tão barato nem valesse a pena, que talvez devesse fazer como os japoneses que jogam tudo fora, não consertam nada, até uma geladeira seminova para eles é sucata. Isso é o se lê por aqui da terra do sol nascente. Porém, eu queria consertar o tal baratinho. Recuperar a agenda e depois doar o aparelho a quem não se importasse de ganhar um que não fosse tão sofisticado. Além disso, fazer uma caminhada até o final da Rua da Consolação seria um ótimo exercício, para quem está há algum tempo de quarentena. Detalhe: o endereço. Ora, eu sabia o nome da rua, que era no sentido dos Jardins e para mim isto basta para chegar ao destino. Tenho amigos que ficam exasperados com esse meu jeito de fazer as coisas, mas não dizem que quem tem boca vai a Roma? - Por favor, poderia-me dizer onde é a assistência técnica da Vivo nesta rua? - Lá embaixo, tá longe, hem! E lá ia eu, prestando muita atenção em todas as portas, médias ou pequenas, com jeitão de loja de conserto. É o método Di de fazer. Enfim, achei. - Quero consertar meu celular. - Veio no lugar certo, disse a simpática atendente. Mas quando eu mostrei o aparelho, ela emendou: - É, mais ou menos. Talvez o conserto fique mais caro que o aparelho. Podemos fazer o orçamento e depois telefonamos. - Combinado, falei. Saí da loja com o sentimento de que tinha feito a coisa certa, afinal era uma decisão que depois eu poderia tomar, além do mais eu estava vivendo aquele clima de “conserto”, a cirurgia, as crises de labirintite que eram vencidas, outros eventos ocorrendo na vida particular, um ponto final numa página da minha vida, talvez um novo ciclo começando, enfim as coisas estavam sendo “consertadas”. Psicologicamente consertar o celular parecia importante, era uma simbologia de uma coisa muito maior. Eu sei que para quem é muito racional tudo isso parece não ter muita lógica, mas é assim que eu funciono, sigo muito a intuição, nessa loucura que é minha cuca. Bem, virando a esquina, a Rua Oscar Freire, onde os bem nascidos, as patricinhas e as celebridades fazem suas compras. Comecei a olhar as vitrines, um vestido lindo, mais de cinco mil reais. Contudo, olhando bem, as liquidações encorajaram-me a entrar em algumas lojas, vasculhar as araras, perguntar o preço e no cúmulo do atrevimento, experimentar. E por que não? Posso não ser bem nascida ($$$), mas com certeza renascida das cinzas muitas vezes. As vendedoras, com um poder de sedução a toda prova, chamavam-me pelo nome, mostravam tudo que eu pedia, explicavam formas de pagamento cada vez que eu exclamava: - Que caro! De repente, o mundo começou a girar. Primeiro devagarzinho, tomei um copo de água, saí às pressas da loja, entrei numa casa de lanches, pedi um sanduíche natural e um suco, não sem antes ter perguntado se aceitavam cartão, porque eu saí para caminhar, sem dinheiro, pretendia subir a Augusta a pé. Já sentada na cadeira da lanchonete, o mundo rodava alucinadamente. Terminei o lanche, chamei o gerente, perguntei-lhe se era possível cobrar a despesa e mais uma quantia, que ele me daria para eu pegar um táxi. Ele ainda teve a gentileza de indagar qual o trajeto que eu faria, calculou o valor, deu-me o dinheiro. No mesmo instante desceu um passageiro de um táxi bem em frente, ele assobiou, fez sinal para esperar. A garçonete levou-me até o táxi. Chegando ao meu endereço, o motorista entrou na garagem, levou-me até o elevador. Já não continha a náusea que eu sentia, pouparei os leitores dos detalhes do que aconteceu no elevador e do que veio a seguir. De tudo isso, concluí que é verdade que celebridade também é gente e ainda continuo acreditando que tudo na vida tem conserto. 07/10/2007
DIANA GONÇALVES
Enviado por DIANA GONÇALVES em 07/10/2007
Alterado em 07/10/2007 |